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11 de out. de 2011

A consciência ambiental de Felipe Neto



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Os especialistas que têm se dedicado ao estudo dos temas ambientais distinguem diferentes correntes, orientações e ideologias ambientalistas, que muitas vezes se confundem. Uma maneira de entender estas diferentes correntes ou ideologias é pensar em uma linha ou contínuo que vai de um extremo que poderíamos chamar de "geocêntrico" a um outro que pode ser chamado de "antropocêntrico".

A corrente geocêntrica parte da idéia de que o homem deve se adaptar e integrar à natureza, e não a natureza ao homem. Nesta perspectiva, os sistemas ecológicos, formados por florestas, rios, mares e campos, assim como as espécies vegetais e animais, são frágeis e insubstituíveis, e estão ameaçados pelo crescimento da indústria, da tecnologia e da ocupação dos espaços pelos homens. 

 Os interesses das pessoas devem se subordinar à necessidade de preservação das espécies e dos ambientes naturais. Para isto, a sociedade deveria ser organizada para atender no máximo às necessidades das pessoas, e não a seus desejos. As tecnologias usadas na agricultura e na indústria deveriam ser as mais simples, fazendo uso intensivo de mão de obra, e poupando ao máximo o uso de recursos naturais, como a água e os minerais. O ambientalismo geocêntrico é uma forma extrema de ambientalismo, na medida em que exige, para se realizar, de uma profunda transformação na maneira pela qual as sociedades estão organizadas.


A visão oposta, também extrema, é a visão antropocêntrica, para a qual a natureza existe para servir ao homem, e não haveriam limites éticos ao uso de recursos naturais e à intervenção e transformação dos ambientes naturais para servir aos interesses humanos. Esta noção faz parte do pensamento moderno que surgiu com a revolução industrial no século XVIII, que supõe que os recursos da natureza seriam infinitos, e que a capacidade humana de encontrar soluções para seus problemas, necessidades e ambições, através da ciência, da tecnologia e pela organização de grandes sistemas administrativos e produtivos, seriam também ilimitados. 

O antropocentrismo é também uma visão extrema, na medida em que não coloca limites à ação de indivíduos ou firmas, vê com ceticismo todas as tentativas de proteger e regular o uso dos ambientes e dos recursos naturais, sem atentar para os evidentes problemas que a expansão descontrolada do uso dos recursos naturais vem criando. Na sua forma extrema, a visão antropocêntrica se opõe às tentativas de governos e organizações internacionais de limitar a ação de indivíduos e firmas como contrárias ao progresso, e acredita na capacidade dos mercados de irem corrigindo, por si mesmos, os desajustes gerados pela espoliação dos ambientes e dos recursos naturais.


É entre estes dois extremos que surge o que se denomina, hoje, de "desenvolvimento sustentável". Este termo foi consagrado, e passou a ser adotado por instituições internacionais, governos e organizações comunitárias em todo o mundo, a partir do já famoso relatório de 1987 da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento denominado "Our Common Future", Nosso Futuro Comum, que ficou conhecido como o "Relatório Brundtland", o nome de sua presidente. A perspectiva do desenvolvimento sustentável é uma perspectiva claramente antropocêntrica, no sentido de que seus documentos expressam a preocupação com o futuro das pessoas, e não com a natureza enquanto tal. 

No entanto, ao contrário das formas extremas do modernismo, o desenvolvimento sustentável supõe que a natureza tem limites, que o progresso humano não pode continuar de forma ilimitada e incontrolável, e que deve haver uma responsabilidade coletiva pelo uso dos recursos naturais. O valor fundamental expresso pelo Relatório Brundtland não é o primado da natureza, nem o primado da liberdade individual, mas a responsabilidade inter-generacional: a idéia de que é necessário atender às necessidades do presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras de atender a suas próprias necessidades.


Tanto quanto as demais perspectivas, o desenvolvimento sustentável é uma ideologia, um valor, uma ética. Sua vantagem sobre as outras perspectivas é que busca incorporar os conhecimentos que vêm se acumulando nos últimos anos sobre os problemas ambientais trazidos pelo progresso descontrolado, e busca encontrar um espaço para o atendimento das necessidades humanas que seja compatível com o equacionamento destes problemas. 

 Este espaço deve ser conquistado tomando em consideração dois elementos essenciais: as necessidades das pessoas, que incluem o direito a uma vida digna, mas não os abusos do consumismo descontrolado; e a idéia de limites ao que é possível fazer com os recursos naturais e ambientais disponíveis. Estas noções definem uma atitude, uma preocupação, que não trazem em si a solução dos problemas. Quais são as necessidades a ser atendidas, como limitar o consumo excessivo sem paralizar a economia e criar desemprego, quais os verdadeiros limites no uso dos recursos naturais, qual a capacidade da natureza de se regenerar, qual a capacidade das pessoas e das sociedades de se adaptar a novas condições ambientais e ao uso de novos produtos, tudo isto é matéria de pesquisa, discussão e experimentos.


Existem pelo menos duas versões do desenvolvimento sustentável. Uma é mais pragmática e menos radical, que procura não se antecipar aos problemas, e tratar de resolvê-los um a um, na crença, típica do modernismo, na grande capacidade das pessoas e sociedades em encontrar soluções para os problemas que vão surgindo; enquanto a outra é mais radical, teme mais pelas consequência catastróficas do desenvolvimento controlado, desconfia dos poderes da iniciativa individual e da tecnologia para resolver os problemas que já surgem no horizonte, e propõe ações preventivas muito mais fortes e decisivas.


As diferentes perspectivas sobre a questão ambiental e o desenvolvimento sustentável estão permeadas por uma outra questão, que é a do papel dos governos e das organizações da sociedade para levar à frente políticas ambientalmente corretas e adequadas. Existem os que defendem a necessidade de grandes sistemas de poder e estruturas complexas de planejamento dentro dos países como internacionalmente; outros acreditam muito mais na força das organizações comunitárias e do poder local; outros, finalmente, colocam suas esperanças na criatividade e eficiência da iniciativa privada. 

A relação entre estas perspectivas políticas e os valores ambientais não são óbvias, e afetam questões como a natureza do regime democrático e o funcionamento de sistemas federativos como o brasileiro: em nome de uma perspectiva geocêntrica, há quem defenda o fortalecimento do poder dos governos centrais e a criação de sistemas internacionais com grande capacidade de controle e intervenção, enquanto que outros defendem a descentralização política e a ação comunitária.


Todas estas perspectivas são, em maior ou menor grau, combinações de conhecimentos, avaliações e valores que as pessoas possuem a respeito da natureza, da vida humana e da sociedade. Quanto mais conheçamos a respeito do que vem ocorrendo na natureza e na sociedade, mais teremos condições de levar à frente e fortalecer nossos valores. 

Existe hoje um grande esforço de conhecer melhor o sentido ambiental da atividade humana, inclusive por parte de agências governamentais internacionais e nacionais, como o IBGE, que precisa ser aperfeiçoado e ampliado.O nosso papel, na educação ambiental, não deve e nem pode se limitar à difusão retórica de nossos valores. Além de dar o exemplo, temos que mostrar aos estudantes as diferentes alternativas e visões sobre o tema ambiental, e sobretudo transmitir conhecimentos que possam aumentar sua capacidade de entendender e avaliar os possíveis sentidos e alcances das diferentes opções.



Nota:


1. Esta análise é feita na introdução ao livro The Politics of Sustainable Development, Theory, policy and practice in the European Union (Londres e New York, Routledge, 1997), editado or Suzan Baker, Maria Kousis, Dick Richardson e Stepeh Young.


2. Veja a respeito Ismail Serageldin, Sustainability and the Wealth of Nations: First Steps in an Ongoing Journey. World Bank, Environmentally Sustainable Development Studies and Monographs Series Nº 5 7/01/96 < 

Disponível em: http://www.schwartzman.org.br/simon/ambiente.htm


by.

Valzinha.

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